Rua chã
.
.
.
Pensamento vagabundo vai.
Se encontrares uma rua chã,
entra no silêncio
que por dentro selou todas as portas.
Demora-te à escuta dos sons antepassados
sobrevoa as casas sobrevoa as próprias aves
olha devagar as sombras altas.
Enfrenta o mistério dos espelhos,
pensamento vagabundo segue.
Suporta a insuportável lucidez dos órfãos,
os seres que foram tocados, digo assim,
pela luz rasante das terras antigas.
Sobrevivem agora no meio da multidão,
na cidade longínqua.
Mil anos passaram
e os olhos dos órfãos já não se reconhecem
algures na rua tão perto da dor.
#40. Victor L., fragmento de fotografia.
7 comentários:
Este poema parece-me profundamente triste, dorido.
Talvez o Victor L. me possa ajudar a entender porque motivo tantos poetas portugueses percorrem na sua escrita caminhos de amargura.
Para Francisca N:
"Rien n'est jamais acquis à l'homme ni sa force/ Ni sa faiblesse ni son coeur et quand il croit/ Ouvrir ses bras son ombre est celle d'une croix/ Et quand il veut serrer son bonheur il le broie/ Sa vie est un étrange et douloureux divorce/
Il n'y a pas d'amour heureux."
(...)
Louis Aragon (1897-1982).
Como el poema es tan bonito e especial, esta estrofa no podia estar en un solo idioma.
El hombre nada adquiere jamás Ni su ternura/Ni su amor ni su fuerza Y cuando abre los brazos/
La sombra que proyecta es una cruz oscura/Y si abraza su dicha la destroza en pedazos/Su vida es una extraña y espantable locura/
No hay ningún amor feliz.
Versión de: Andrés Holguín
Já pensaram, na quantidade de hispano-falantes andam pelo mundo?
Mas que fique claro, que se alguém o tem em Português, por favor, não deixe de enviá-lo, por que assim servia, também, para os galegos/as, que andamos…
No seguimento do comentário de Pilar, atrevo-me a traduzir Aragon para português:
O homem nunca adquire nada nem a sua força/ Nem a sua fraqueza nem o seu coração e quando crê/ Abrir os braços a sua sombra é a de uma cruz/ E quando crê abraçar a felicidade ele esmaga-a/ A sua vida é um estranho e doloroso divórcio/ Não há amores felizes.
Quanto à poesia portuguesa, triste quando é triste, feliz quando é feliz.
Victor L. parece-me tendencialmente triste, mas leio nos seus poemas rasgos de alegria e plenitude.
Continuando,
"Man never truly possesses anything/ Neither is strenght, nor his weakness, nor his heart/
And when he opens his arms
His shadow is that of a cross
And when he tries to embrasse happiness
He crushes it
His life is a strange and painful divorce
There is no happy love"
(in Verbal Collage, cadavre exquis)
Depois do ler em inglês, por unanimidade, a versão ganhadora é a de Roteia.
Bonito poema de quem pressente a perda. Mas todos nos encontramos no mesmo ponto. A distância é ilusória.
Um grande abraço
Enviar um comentário